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Será o Alongamento Excessivo Prejudicial?  (Is Over Stretching Bad?)

Muitos professores de dança, pais preocupados ​​e profissionais de saúde estão inquietados com o que vêem a acontecer no mundo da dança, especialmente online. Todos os dias vemos imagens de alongamentos que sabemos que não devem ser seguros, porém os alunos que os fazem, muitas vezes, também estão a treinar a alto nível e a ganhar competições. Os professores de dança que evitam os alongamentos excessivos e erram do lado da cautela, evitando coisas como oversplits em segunda, muitas vezes sentem-se deixados para trás, e enfrentam a pressão dos alunos e pais para "acompanhar os tempos".

Tenho mantido o silêncio sobre esta questão em particular por algum tempo, porque tentei sempre focar-me no positivo, em vez de criticar a formação de qualquer outra pessoa, mas algumas das coisas que vi recentemente online estão a ficar ridículas.

Também, cada vez mais frequentemente me está a ser solicitado um post que os professores possam direccionar os pais dos seus alunos, para explicar as razões pelas quais este tipo de treino deve ser feito com muito cuidado. Então aqui vai!!

Então, será o alongamento excessivo prejudicial?

O simples facto de que tantas pessoas me perguntarem esta questão parece indicar que sabem que é... Mas por que é prejudicial? E o que podemos fazer para conseguir uma mobilidade incrível sem riscos de lesão desnecessários?

Só para esclarecer - Eu não tenho problemas com mobilidade extrema quando atingida com segurança, e combinada com o controlo apropriado. Na verdade, grande parte do trabalho que faço com as crianças de nível elevado e realmente de elite é focado exatamente neste assunto.

O nosso  Curso de 3 dias de formação para professores foca-se em como treinar de forma óptima cada tipo de corpo e trabalhar as restrições específicas para desenvolver a mobilidade e controlo óptimos em todos os bailarinos. No entanto, concentramo-nos em conseguir isto através de uma forma educada e informada, actual e inteligente, para evitar possíveis problemas, e, os alunos são educados para gerirem os seus próprios corpos.

O nível de desempenho em todos os estilos de dança acelerou enormemente nos últimos anos, e, como tal, as técnicas de treino para suportar isto mudaram drasticamente. Infelizmente, isto significa que temos conhecimento limitado sobre os efeitos a longo prazo destas técnicas e muitas pessoas estão, com toda a razão, preocupadas com o que está a acontecer sob a superfície. Enquanto outras disciplinas como a ginástica rítmica e o contorcionismo têm trabalhado com o alongamento excessivo e amplitudes extremas durante anos, ainda há pouca pesquisa formal sobre os efeitos a longo prazo deste tipo de formação sobre os indivíduos envolvidos.

Embora seja verdade que existem alguns corpos que sobrevivem a treino como este, existe uma taxa de atrito enorme pelo caminho, e muitas pessoas que defendem o treino extremo não têm ideia do problema a longo prazo que podem estar a causar.

Overstretching Side Leg mount 0.3 - Cartoons - Mike Howell - L3 Flex - Dance Teacher Training - Lisa Howell - The Ballet Blog

Todos os dias, no meu trabalho como Fisioterapeuta, vejo pessoas que sofrem de lesões antigas sustentadas por alongamentos excessivos, extensões repetidas e articulações excessivamente móveis e instáveis ​​de formação inicial. Infelizmente, a reabilitação lenta e difícil que tantas pessoas têm que percorrer para simplesmente serem capazes de viver uma vida normal sem dor não é um entretenimento tão cativante, pelo que não obtém a publicidade que as fotos dramáticas e os vídeos de performances envolvendo extrema flexibilidade têm.

Então o que é o "Alongamento Excessivo"?

A visão geral é que o alongamento excessivo é levar qualquer articulação para além da sua amplitude fisiológica natural e, especialmente, alongando os ligamentos que normalmente ajudam a suportar a articulação, para que se torne mais móvel. O alongamento excessivo também pode ser quando o indivíduo é forçado numa posição que resulta em dano traumático para os tecidos que anteriormente restringiam a amplitude.

Muitos alunos jovens, especialmente aqueles que já têm hipermobilidade, estão a ser colocados em amplitudes que sobrecarregam uma área particular, no desejo de alcançar amplitudes dramáticas de flexibilidade. Sinto-me tão triste que tantas pessoas pensem que isto é uma boa ideia, e um entretenimento óptimo, quando não fazem ideia do verdadeiro custo que isto tem.

Enquanto fisioterapeuta para bailarinos surgem-me constantemente perguntas como:

  • Quais são os riscos do alongamento excessivo?
  • Ela parece divertir-se! Se isto não a magoa, certamente não há problema?
  • Existem perigos no alongamento excessivo com alunos jovens?
  • Como é que sabemos se estão a alongar demasiado?
  • Quais são os riscos em posições diferentes?
  • Ela quer ser uma bailarina profissional; não será isto uma parte disso?
  • Qual é o efeito a longo prazo nas ancas, costas e joelhos destes alunos, à medida que eles progridem de dedicados jovens bailarinos para, quer uma carreira profissional na dança, um professor, ou uma pessoa 'normal' a tentar viver uma vida saudável?
  • Existe outra maneira de alcançar o mesmo nível de mobilidade com segurança?
  • O alongamento PNF é seguro?
  • Por que é que algumas pessoas fazem isso facilmente e os outros não?
Overstretching 0.1 - Cartoons - Mike Howell - L3 Flex - Dance Teacher Training - Lisa Howell - The Ballet Blog

Para responder a essas perguntas tão claramente quanto possível, coloquei abaixo alguns pontos breves, mas também estou a criar uma série de posts mais abrangentes, cada um sobre uma posição ou questão diferente, combinados com alguns desenhos animados fabulosos (cortesia do meu incrível Pai - Mike Howell) para ilustrar os potenciais perigos e considerações do alongamento excessivo. Fique atento a cada um conforme são publicados:

  1. Quais são os riscos do alongamento excessivo?

Se uma articulação, como a da anca, é forçada para além da sua amplitude de movimento normal existe o risco de danificar os tecidos envolventes, incluindo o labrum da anca, os ligamentos que rodeiam a articulação ou, no caso da coluna vertebral, os discos que conferem a capacidade de absorção de choque e a mobilidade da coluna vertebral.

Em alunos jovens cujos ossos não estão totalmente desenvolvidos também existe um sério risco de danificar a estrutura da articulação da anca, ou o desenvolvimento de fraturas por stress da coluna vertebral ou Espondilolistesis.

A longo prazo, articulações sobre-estiradas têm um maior risco de desenvolver alterações artríticas devido ao desgaste na articulação.

young hip growth plate overstretching- Hip X-Ray - Lisa Howell - The Ballet Blog
  1. Ela parece divertir-se! Se isto não a magoa, certamente não há problema?

Não.

A minha resposta a esta questão geralmente é...

"Ela ganha peso da primeira vez que come uma barra de chocolate? (Não...) E gosta? (Sim...) Deixá-la-ia comer chocolate 5 vezes por dia? (Não!) O que acha que acontecerá se ela receber vários milhares de "Gostos" cada vez que ela come um...? (Oh... Wow ... Ok ...)

 

Há um efeito cumulativo dos danos sofridos devido ao excesso de alongamento. À medida que os ligamentos designados para suportar cada articulação se tornam mais e mais relaxados pelo estiramento excessivo, o deslocamento interno das superfícies articulares uma contra a outra aumenta. Este é um contribuinte enorme não só para a dor nos músculos que tentam suportar a articulação instável, mas também para o desgaste de longa duração e laceração da cartilagem dentro da articulação, levando à degeneração precoce das articulações.

Overstretching Swing 0.2 - Cartoons - Mike Howell - L3 Flex - Dance Teacher Training - Lisa Howell - The Ballet Blog
  1. Existem perigos em começar o alongamento extremo em alunos jovens?

Sim. Agora tenho  evidência de Raio X dos danos que podem ser feitos em ancas jovens  através do alongamento excessivo. Os ossos de adolescentes (especialmente na pélvis, coluna e pé) são muito vulneráveis e qualquer tipo de treino de mobilidade extrema em alunos jovens deve ser considerado com muito cuidado.

oversplits hip xray
  1. Como é que sabemos se estão a alongar demasiado?

Durante quaisquer exercícios de flexibilidade, os alunos não devem experienciar dor. Se eles fazem uma careta, choram, ou tentam sair da posição, o corpo estará a lutar contra e as hipóteses são de que não é seguro.

Qualquer "alongamento" deve ser sentido como uma tensão generalizada através do ventre do músculo que está a ser alongado. NÃO deve sentir:

  • Dor na articulação
  • Como se a articulação precisa de 'estalar'
  • Uma “linha” forte de tração (muitas vezes isto é um nervo)
  • Dor numa outra área (isto é, tração na barriga da perna quando está a tentar alongar os isquiotibiais – mais uma vez, esta é geralmente fascial ou tensão neural)
  • Dor no lado oposto da articulação (ou seja, na parte de trás da anca durante as espargatas de segunda – isso não vai ficar melhor com mais pressão)
Butterfly Stretching 0.1 - Cartoons - Mike Howell - L3 Flex - Dance Teacher Training - Lisa Howell - The Ballet Blog
  • Dor de compressão (isto é, na parte da frente da anca ao puxar os joelhos para o peito)
  • Não deve haver dor no dia seguinte (não – nem mesmo um "dorido bom")

Devemos também ter muito cuidado com a programação do nosso trabalho de flexibilidade. Mesmo os alongamentos prolongados cuidadosos não devem ser feitos antes da aula, pois se um músculo é mantido num alongamento estático por mais de 30 segundos, então este não vai funcionar em plena capacidade durante, pelo menos, meia hora depois. Os alunos muitas vezes sentem-se tipo "gelatina" e com menos controlo, o que os coloca em risco de lesão.

  1. Ela quer ser uma bailarina profissional; não será isto uma parte disso?

Não. E mais uma vez, depende do tipo de bailarino que eles querem ser. Na maioria dos géneros, ser um bailarino profissional requer um bom nível de flexibilidade, no entanto, este também deve ser acompanhado de um elevado nível de força e controlo das ancas e controlo dinâmico da coluna, de forma a conseguir ter uma carreira longa, sustentável e agradável.

Por exemplo, se o teu objetivo é ser uma bailarina clássica, então ser capaz de fazer um alongamento em "agulha" ou "escorpião” aos 12 anos não faz parte do conjunto de capacidades necessárias, e muito provavelmente será prejudicial devido à criação de muito movimento numa articulação. No entanto, se queres ser um artista de circo acrobático, então, será mais relevante.

  1. Qual é o efeito a longo prazo nas ancas, costas e joelhos destes alunos, à medida que eles progridem de dedicados jovens bailarinos para,quer uma carreira profissional na dança, um professor, ou uma pessoa 'normal' a tentar viver uma vida saudável?

Mobilidade excessiva em qualquer articulação requer um controlo mais fino e coordenado dos músculos estabilizadores em torno dessa e vai exigir uma enorme quantidade de dedicação aos exercícios de estilo 'rehab' para permanecer livre da dor. É essencial que os bailarinos tenham um bom controlo postural e resistência, e gastem tempo a manter cada articulação saudável para evitar a dor associada com a mobilidade excessiva e degeneração articular. Sem esta força e coordenação, os indivíduos muitas vezes são atormentados com dor nas costas e na anca a longo prazo, as quais podem ser muito difíceis de tratar devido à instabilidade das articulações.

  1. Existe outra maneira de alcançar o mesmo nível de mobilidade com segurança?

Sim.

Simplesmente, considero o alongamento que é feito na direção que se pretende ir, a forma mais lenta e mais perigosa de realmente chegar lá. Forçar sobre uma restrição, muitas vezes, ativa uma contração reflexa dos tecidos, através da qual terá de se forçar, potencialmente, causando dano nos tecidos moles (ou ligamento/ capsular).

Em vez de alongar e forçar corpos jovens na direção em que eles estão a tentar alcançar, eu concentro-me em utilizar esse ‘alongamento’ como um teste, analisando o que está realmente a causar a restrição e, em seguida, realizando mobilizações calculadas e específicas, e libertando as estruturas daqueles indivíduos. Então, quando o movimento é realizado novamente, torna-se muito mais fácil. Isso pode ser tudo feito sem dor ou o risco de danificar músculos ou ligamentos.

Trabalhar corretamente com o sistema fascial também pode dar enormes aumentos na mobilidade sem risco de danos. A nossa compreensão da natureza da fáscia explodiu exponencialmente nos últimos 20 anos, e isto já não significa os meios mais agressivos como utilizar um rolo de espuma (Foam Roller) ou a Massagem dos Tecidos Profundos. Mobilizações fasciais como as mostradas para a parte superior das costas AQUI  e  as ancas AQUI podem ser muito fáceis de fazer, mas podem ter um efeito profundo sobre a tua mobilidade.

Por exemplo: uma pesquisa no Google sobre a palavra " fáscia ", em 2001, deu cerca de 1500 entradas. Procura essa palavra agora e terás "cerca de 48 milhões"...! É essencial que atualizemos as nossas técnicas de treino para "acompanhar os tempos" e usar essa pesquisa nova e surpreendente nas melhores maneiras possíveis.

Os alunos devem aprender a trabalhar com o seu próprio corpo, e como serem complacentes com suas peculiaridades, em vez de combatê-la, resultando em uma maior e mais utilizável flexibilidade, com muito menos risco de lesão. Voltei a minha atenção para treinar professores e profissionais de saúde  em meios mais seguros para trabalharem com os seus alunos de dança, de modo a tornar o treino da dança mais seguro em todo o mundo.

  1. O alongamento PNF é seguro?

Não, não em adolescentes.

Embora muitos adultos encontram no alongamento PNF ou contração/relaxamento uma forma eficaz de aumentarem a sua mobilidade, eu não acredito que essa técnica deva ser utilizada em estudantes com idade inferior a 16 anos. Muitos músculos principais, incluindo os isquiotibiais e quadríceps unem-se a grandes placas de crescimento. O alongamento agressivo durante períodos de crescimento pode provocar uma Fratura Avulsa (onde um fragmento de osso é arrancados do osso principal). Estas lesões são muitas vezes difíceis de reabilitar e muitas vezes exigem um longo tempo sem dançar para fazê-lo.

  1. Por que é que algumas pessoas fazem isso facilmente e os outros não?

Fisiologicamente, somos todos diferentes. Algumas pessoas têm naturalmente maior mobilidade nos seus ligamentos do que outras e irão ter maior facilidade em colocarem-se em algumas posições. Muitas vezes, aqueles que têm maior facilidade precisam de mais cuidados, pois os seus ligamentos serão menos resilientes a longo prazo. Tenho visto muitos alunos a postar fotografias online da sua excessiva mobilidade, os quais suspeito terem Síndrome de Ehlers-Dalos  não diagnosticado. Se um aluno tem essa condição, é ainda mais importante garantir que o treino não provoca alongamento excessivo nos seus tecidos já fracos.

A classificação varia, mas é importante que todos os professores saibam as diferenças entre as seguintes:

Indivíduos com maior mobilidade nas articulações, muitas vezes, também encontrarão maior dificuldade em sustentar uma boa posição postural, resultando em dor constante na parte inferior das costas e nos músculos do pescoço. Aqueles com Síndrome de Hipermobilidade Articular ou Síndrome de Ehlers Danlos também podem ter problemas com a  sua bexiga e intestino, pois todo o seu tecido conjuntivo é afetado.

Em conclusão:

 

Se está envolvido na formação de jovens alunos, é muito importante estar consciente dos possíveis perigos que existem, e entender que a formação de jovens adolescentes é diferente de treinar adultos. É nossa responsabilidade aprender as formas mais seguras possíveis para eles alcançarem os seus objetivos, bem como, educá-los sobre a adequação dos seus objetivos para a carreira escolhida. É por isso que dedico tanto esforço em desenvolver cursos de formação de professores abrangentes, para dar aos professores e profissionais de saúde ferramentas para ajudarem os alunos a fazer coisas incríveis com segurança.

Estou muito preocupada com o que está a acontecer em algumas "master classes" e workshops onde qualquer criança é forçada em posições, com a promessa de que irá torná-la famosa – quando, na realidade, é mais provável prejudicá-la. O alongamento excessivo forçado em uma sessão não é a forma de te tornares mais móvel.

Mobilidade articular excessiva é diferente de flexibilidade excelente e não é um requisito para o sucesso como bailarino profissional. Precisamos pensar nos nossos alunos como seres humanos com tanto potencial, e não apenas póneis para apresentação descartáveis. Com toda a certeza, posso dizer que, se algum dia tiver a bênção de ter uma filha, não irei deixá-la colocar o seu corpo em tal risco à custa do entretenimento de outra pessoa. Haverá sempre alguém que está disposto a fazer isto - mas eu antecipo uma vida muito longa e eu preferia que ela a desfrutasse em pleno!

Eu também não concordo com a sugestão de que actuar a um nível de elite tem de resultar em danos a longo prazo! O meu foco está em dar aos atletas carreiras longas e sustentáveis, onde os seus corpos estão continuamente afinados, refinados, e especificamente treinados para atingir o nível máximo de desempenho. Por sua vez, isto torna-os seres humanos com funcionamento altamente excepcional para além da sua carreira de artes performativas. Isto leva tempo e esforço, mas os resultados valem bem a pena.

Saiba mais sobre o nosso workshop Formação para Professores Nível Um AQUI.

Para visualizar os raios-X duma jovem aluna que estava a fazer alongamentos excessivos numa escola de dança competitiva – CLIQUE AQUI

Espero que tudo isto faça sentido e responda a todas as questões que têm sido colocadas. Continuarei a adicionar artigos neste tópico, por isso estou ansiosa por receber os vossos comentários e qualquer coisa que possa ter perdido!

Lisa Howell

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